Ponto Chic: 100 anos na história de São Paulo

Laboratório de JO 2020
5 min readOct 20, 2020

--

Por Bárbara Castro, Maria Clara Vaiano e Vinícius Novais, alunxs do 1º JOB

O ano é 1922. No centro de São Paulo, artistas se reúnem para mudar os paradigmas artísticos do país. Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Tarsila do Amaral e todos os outros grandes nomes que aprendemos na escola fazem do Theatro Municipal o palco de sua revolução artística. Mas o que acontecia logo depois, quando as cortinas vermelhas do palco se fechavam e os artistas, cansados, se dirigiam para o camarim? O que acontecia logo após, quando a adrenalina baixava e os corpos imploravam por energia? O que os artistas faziam?

Funcionários no começo do restaurante (foto divulgação)

Bem, é fácil de se responder. Eles saíam do teatro, subiam a Praça Ramos de Azevedo, que os levava ao extremo sul da Avenida São João. Assim a turma da Semana de Arte Moderna de 1922 chegava ao Largo do Paissandu e ao seu destino: um recém-inaugurado restaurante.

O local, em específico, era um bar e lanchonete que ainda não tinha nome, contudo não permaneceu assim por muito tempo. Com seus lustres franceses e seu balcão de mármore carrara, logo foi apelidado pelos modernistas de Ponto Chic.

Final da década de 30. Getúlio Vargas instaura o Estado Novo e se torna ditador. No sul do país, revoltas eclodem. Em São Paulo, os estudantes de direito da Universidade de São Paulo, no Largo de São Francisco, pensam em formas de lutar contra o regime. Mas a faculdade era vigiada e precisavam de um lugar para se reunir, então sobem no bonde em direção ao Largo do Paissandu. O Ponto Chic foi o local escolhido pelos estudantes para planejar as revoltas, guardar bandeiras, estacas e até armas. Tudo o que se pode usar em uma manifestação, nem sempre pacífica.

Reunião dos estudantes de direto do Largo do São Francisco em 1937 (foto divulgação)

Anos 50. O Palmeiras, um dos clubes mais populares de São Paulo, tem entre seus sócios Odílio Cecchini, o dono e fundador do Ponto Chic. Não demorou para jogadores, técnicos, torcedores e até alguns juízes de futebol passarem a frequentar o restaurante. Nada era mais comum do que ver alguma briga pelo resultado ou pela arbitragem dos jogos.

A partir dos anos 80, segundo Rodrigo Alves, atual proprietário , o Ponto Chic se tornou uma casa para todos em São Paulo. Em uma cidade tão diferente, um restaurante precisa de espaço para todos. Você pode ver uma família almoçando ao lado de um casal LGBTQIA+ e ainda cruzar com idosos e jovens na fila para entrar.

Em 2020, no “Novo Normal”, o Ponto Chic não fez demissões e se apoia nos deliveries, máscaras e álcool em gel. O restaurante resiste à cidade que sempre muda.

O famoso Bauru

(infográfico Os Passos Do Bauru por Bárbara Castro)

Em dezembro de 2018 o bauru foi declarado Patrimônio Cultural e Imaterial do Estado de São Paulo. Seu criador, Casemiro Pinto Neto (apelidado de Bauru por ser essa sua cidade natal), contou assim como criou o sanduíche:

“Era um dia que eu estava com muita fome. Cheguei para o sanduicheiro Carlos — hoje já falecido — e falei: — Abre um pão francês, tira o miolo e bota um pouco de queijo derretido dentro. Depois disso o Carlos já ia fechando o pão. Eu falei: — Calma, f alta um pouco de albumina e proteína nisso. (Eu tinha lido em um opúsculo livreto de alimentação para crianças, da Secretaria da Educação e Saúde, escrito pelo ex-prefeito Wladimir de Toledo Piza, também frequentador do PONTO CHIC — que a carne era rica nesses dois elementos) bota umas fatias de roast beef junto com o queijo e já ia fechando de novo quando eu tornei a falar: — Falta a vitamina, bota aí umas fatias de tomate. Quando eu estava comendo o segundo sanduíche chegou o “Quico” — Antonio Boccini Jr. — , que era muito guloso e pegou um pedaço do meu sanduíche e gostou. Aí ele gritou para o garçom, que era um russo chamado ALEX: Me vê um desses do “BAURU”. Os amigos foram experimentando e o nome foi ficando. Todos quando iam pedir falavam: Me vê um do “BAURU” e assim ficou o nome de BAURU para o sanduíche” (enxerto retirado do site oficial do Ponto Chic).

O sanduiche que mantém a mesma receita e o mesmo sucesso: o Bauru (foto divulgação)

O Ponto Chic que conhecemos hoje

Como em todas as histórias, até mesmo o Ponto Chic tem seus pontos baixos. Em 1977, o proprietário do prédio, que era alugado, revogou o contrato fazendo com que o restaurante não tivesse mais um lugar para funcionar. Odílio Cecchini, que já tinha idade avançada e não possuía herdeiros, resolveu fechar o Ponto Chic.

Não demorou muito para que o Ponto Chic reabrisse, logo em 1978. Um ex- gerente da casa chamado Antônio Alves de Souza, que tinha espírito empreendedor, estava abrindo o seu próprio negócio em Perdizes: o restaurante Passarela. Ao saber que o Ponto Chic iria fechar as portas, resolveu comprar a marca de Cecchini e, assim, o restaurante voltou à ativa em um novo endereço.

Três anos depois, José Carlos Alves — filho de Antônio —, passando pelo Largo do Paissandu, se surpreendeu ao olhar para o prédio original do Ponto Chic e ver uma placa de aluga-se. Rapidamente eles entraram em contato e alugaram o prédio, do qual até hoje pagam aluguel.

Atualmente a casa é administrada por Rodrigo Alves, o neto de Antônio, que vem modernizando os equipamentos e deixando o cardápio mais inclusivo, com pratos veganos e vegetarianos. O restaurante segue se adaptando e assim chegará, em 2022, aos 100 anos.

Antônio Alves, o avô, José Carlos, o pai, e Rodrigo, o neto: as três gerações que comandam o Ponto Chic (foto divulgação)

Um dia no Ponto Chic

O dia a dia no resturante é rotineiro e segue a hierarquia da cozinha para atender os clientes. José Francisco da Silva, mais conhecido como Chiquinho, conta seu dia nesse cotidiano. A única coisa que vem alterando a rotina do Ponto Chic, desde março, é o novo Coronavirús que acrescentou cuidados no tratamento dos alimentos e dos clientes

(áudio captado por Maria Clara Vaiano, editado por Bárbara Cástro)
Garçom com luvas, máscaras, face shield e alcool em gel no bolso. As novas práticas na pandemia (foto Vinícius Novais)

--

--

Laboratório de JO 2020
Laboratório de JO 2020

Written by Laboratório de JO 2020

Espaço para a produção dos alunos do 1º ano de Jornalismo da Faculdade Cásper Líbero

No responses yet